Wagner Gonzalez |
Final da temporada provoca reflexão sobre o atual estado do
automobilismo nacional. Enquanto a categoria máxima do esporte não dorme nos
louros, vivemos entre sonhos e pesadelos
A principal categoria do mundo se reinventa e se adapta para
manter a posição de principal polo de investimentos tecnológicos e promocionais
do esporte a motor mundial, o automobilismo brasileiro tropeça em egos e na
ineficiência da Confederação Brasileira de Automobilismo que, por seu próprio
estatuto, deveria zelar por sua saúde, vitalidade e eficiência. Não é o caso de
comparar os ambientes de negócios entre os dois cenários mas, isto sim, alterar
o status atual que permite ao conceito monomarca ocupar cada vez mais espaços e
aniquilar a verdadeira base do esporte em terras tupiniquins. Quando as vendas
de automóveis no mercado nacional batem sucessivos recordes fica difícil
entender porque não se consegue trazer para as pistas 1% dos 3 milhões de
carros vendidos a cada ano até os nossos autódromos.
Há tempos o automobilismo brasileiro navega com mais intensidade
nas águas plácidas das categorias monomarca, realidade onde a F Truck é a única
exceção a essa verdadeira epidemia. Este território dos brutos é, na prática,
um feudo controlado com mãos de ferro pela família Félix; ciente do trabalho
que teve para criar o circo, Dona Neusa e seus rebentos toma as devidas
precauções para manter sadio o único evento verdadeiramente multimarcas do País
e no qual as fábricas investem em técnica e marketing. No quintal da Vicar,
outra promotora de provas de pista que atua no âmbito nacional e hoje
incorporada pela empresa Time 4 Fun, pratica-se o conceito do pacote fechado,
mas em outros termos: os chassis, motores e suspensões são iguais para os
participantes dos Campeonatos Brasileiros de Stock Car e de Turismo. Neles a
construção dos chassis e a manutenção dos motores e caixas de câmbio são feitos
exclusivamente pela empresa JL. Outro produto da Vicar – o Campeonato Brasileiro
de Marcas - promove a rivalidade entre Chevrolet, Ford, Honda, Mitsubishi e
Toyota onde, pasme-se, a única diferença entre os veículos é a carroceria.
O que se consegue com este modelo também praticado cada vez mais
no kartismo é a concentração de poder e o fim de uma espécie cada vez mais
rara: a dos preparadores, em especial os de motores. Nas categorias que ainda
poderiam fazer a diferença nota-se, mais uma vez, a inoperância dos dirigentes,
que não conseguiram evitar o nascimento de campeonatos que não superaram duas
temporadas, alguns ate sequer ultrapassando o estágio de apresentação pomposa.
Já os campeonatos regionais de turismo correm com regulamentos diferentes, o
que acaba impedindo que exista um campeonato nacional representativo e, pior,
afastando ainda mais as fábricas. Embora tenhamos um parque dos mais
representativos no que diz respeito ao número de fábricas de automóveis
instaladas no País, conta-se nos dedos da mão esquerda e com unha encravada aquelas
que participam de alguma maneira das corridas nacionais.
Vale lembrar que os oito títulos que os pilotos brasileiros
conquistaram na F1 foram consequência de um processo onde tínhamos vários
promotores, um automobilismo que abria espaço para fábricas e, principalmente,
uma categoria tão boa e barata quanto à Fórmula Vê implantada pelo saudoso
Mauro Forjaz, então editor da Autoesporte dos tempos em que esta revista
publicava mais esporte do que autos. Graças a visionários da estirpe de Antonio
Carlos Scavone, Eloy Gogliano, Mário Pati e Wilson Fittipaldi nutria-se um
ambiente que gerou de projetistas de F1 a preparadores de bairro e
arquibancadas cheias em autódromos e kartódromos.
Alguns argumentarão que categorias que fizeram sucesso no passado
tinham algo de monomarca: a época de ouro da Divisão 3 na classe A teve domínio
dos Fuscas e havia também os Festivais… de Marcas, onde cada marca ou modelo
disputava sua própria bateria. Mas se a marca era mono, os preparadores eram
poli e encontrar duas carrocerias idênticas naqueles grids de Divisão 3 era
digno de ganhar na mega sena.
É possível reeditar esses tempos e recolocar o automobilismo como
um esporte popular e mais abrangente. Estruturar o esporte de forma a criar um
sistema onde carros de ponta possam alimentar categorias inferiores após duas
temporadas de uso, consolidando um mercado autossustentável, é uma
possibilidade factível diante de uma queixa de alunos saídos das escolas de
pilotagem: a falta de opções para praticar o automobilismo. O Campeonato
Paulista de Força Livre é um exemplo disso e a categoria Marcas e Pilotos
poderia incentivar a renovação de seu grid com a utilização de carros mais
antigos – e portanto mais baratos -, para estreantes e novatos. Com o
planejamento adequado pode-se programar uma categoria com modelos de maior
cilindrada que os atuais 1,6 e com preparação mais sofisticada para atender ao
progresso dos pilotos e o crescimento do evento.
Tão importante quanto isso é criar novos canais de interação com o
público que pode vir novamente tornar-se entusiasta do esporte. Se a grande
mídia ignora o automobilismo tanto quanto outras práticas e especialidades, que
se encontre alternativas tanto na comunicação quanto no formato do espetáculo,
que deve ser atraente dentro e fora das pistas. Afinal, quem se sujeita a
passar o dia – ou parte dele -, em um autódromo onde o acesso é cada vez mais
difícil e inexiste uma estrutura que ofereça itens tão básicos como praça de
alimentação e banheiros? Estratégia, marketing e planejamento são ferramentas
que podem e devem ser exploradas neste contexto e há profissionais competentes
no mercado com capacidade para desenvolver um trabalho consequente.
F1 dá adeus aspirado e volta em 2014 com motor turbo
A nona vitória consecutiva do alemão Sebastian Vettel e o adeus do
australiano Mark Webber dividiram as atenções do GP do Brasil disputado domingo
(23) em Interlagos, prova que marcou a despedida de Felipe Massa da Ferrari.
Desde 2006 usando motores V8 e 2,6 litros, a F1 usará a partir de 2014 motores
turboalimentados e de configuração V6 construídos para obter o melhor
rendimento energético para 100 kg de combustível na distância de
aproximadamente 320 km, percurso que os pilotos percorrem a cada GP
considerando-se as voltas de alinhamento, apresentação e distância da prova.
Além disso serão usados recuperadores de energia mais sofisticados
O retorno à esta fórmula empregada mais recentemente entre 1977 e
1988 e a adoção de regras que proporcionem melhor aproveitamento energético
atende às demandas de grandes fábricas, à necessidade de dar um apelo
politicamente correto ao esporte e à perene cobrança da própria F1 em se manter
como ápice da tecnologia aplicada ao automobilismo. Certamente as provas de
Endurance também proporcionam o desenvolvimento de novas soluções mas é no
mundo dos Grandes Prêmios que este exercício tem maior difusão. Mais detalhes
sobre o regulamento do ano que vem e o motor que a Renault prepara para a
próxima temporada você ler neste post de Bob Sharp.
Se o Cirquinho do Tio Bernie deu adeus ao regulamento que foi
atual até anteontem, o mesmo gesto não está garantido com relação às
instalações do box e paddock de Interlagos. A prometida e propalada reforma
destas áreas, condição apontada como vital para manter o GP brasileiro no
calendário de 2014, parece ter emperrado na burocracia que caracteriza o Estado
brasileiro. Além da confusão e do desgaste que a indecisão cria no cenário
internacional a ausência de um plano confiável traz consequências ao
automobilismo nacional já que torna-se inviável garantir que os eventos
programados para o autódromo paulistano possam ser anunciados e confirmados.
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