Wagner Gonzalez |
Depois de muitas idas e vindas, finalmente a Renault confirmou
que volta a ter sua própria equipe na F-1. A novidade mais conhecida da
temporada deve gerar nova distribuição nas forças que atuam na categoria e ter
conseqüência na forma como ela será administrada.
Há poucos dias
o todo-poderoso da aliança Renault-Nissan, Carlos Ghosn, anunciou que a
fabricante francesa adquiriu o Lotus F1 Team, algo que significa um novo fim na
história da marca criada por Colin Chapman e uma nova era em várias outras
frentes. Algumas delas estão diretamente ligadas à categoria: uma estrutura de
alta tecnologia voltada ao esporte continuará existindo e dando emprego a
centenas de profissionais de ponta, as 22 vagas de 2015 continuarão preenchidas
e a Red Bull terá motores para seguir ativa. Num contexto mais reservado as
mudanças serão profundas e a notícia, que pode ser lida nesta página do site da Lotus, tem valor bem maior que o
suposto bilhão de dólares que sairá do orçamento da fábrica de automóveis para
o time de Entsone nos próximos dez anos.
É sabido que Carlos Ghosn é o tipo do executivo capaz de
descobrir formas de aumentar o faturamento que destoam do conforto e da
estabilidade de um mundo cor de rosa. Para reerguer a Nissan ele foi corajoso e
duro em doses nada homeopáticas e ignorou a tradição japonesa que garantia aos
salaried men japoneses um emprego vitalício. Para cortar custos e manter a
empresa viva ele eliminou muitos postos de trabalho e criou uma fama pouco
lisonjeira. Deu certo e a Nissan está aí até hoje, sinal que o objetivo que
justificou sua contratação foi alcançado.
O significado
de Ghosn para a F-1 atual trilha caminhos semelhantes, mas por estradas mais tortuosas
e menos conhecidas aos não iniciados: ele representa um nível até então inédito
de disputa entre os construtores e Bernie Ecclestone. Não é ilógico pensar que
nunca antes na história da F-1 aconteceu um confronto dessa magnitude. Alguns
se lembrarão de Enzo Ferrari e sua maquiavélica prepotência, como a disputa com
a FIA e Ecclestone ao anunciar que trocaria a F-1 pela Indy em 1986. Ele chegou
a apresentar um carro pronto para competir, mas o modelo 637 projetado por
Gustav Brunner nunca foi visto andando por seus próprios meios, pelo menos
publicamente… Em 1964 John Surtees disputou os GPs do México e dos EUA com seu
Ferrari 158 pintado de branco e azul por ter sido inscrito pela North America
Racing Team, do amigo Luigi Chinetti, importador da marca nos EUA. Outra vez,
conseqüência de uma disputa com os dirigentes da FIA naquela época.
Ferrari foi o
único homem a quem Ecclestone sempre mostrou reverência e externou um respeito
ímpar. Nem Ron Dennis — que galgou os degraus da fama e fortuna desde o chão de
aprendiz de mecânico até o patamar de Mr. Obsession—, dobrou Ecclestone, ele
mesmo um vendedor de motos usadas quando tinha um quarto de seus mais de 80
anos atuais. Pelo caminho ficaram organizadores de provas, aproveitadores de
ocasião e empresários mal assessorados.
O nível da
disputa atualmente é bem diferente de tais adversários e isso explica muita
coisa, entre elas a demora da Renault em anunciar o que todos davam como certo
mas não assinavam embaixo. Interessava à Renault se manter na F-1, mas nada que
fosse vital; perder a Renault seria desastroso para Ecclestone, mas isso não
podia acontecer a qualquer custo. Daí a longa tratativa: Ghosn queria
equivalência de status com a Ferrari e a Mercedes — o que garante recursos —, e
Bernie não ama filantropia. O inglês também não queria perder a Red Bull, que
de forma não tão velada insultou a Renault, sua parceira de quatro temporadas
dignas da Mercedes atual, quando a receita do bolo desandou.
O novo
cardápio trouxe uma solução gourmet, onde a Red Bull continuará usando os
motores franceses rebatizados de TAG-Heuer — nenhuma relação com a Techniques
d’Avant Garde da era McLaren de motores Porsche V-6 —, o que ajuda a garantir
um faturamento mais saudável, posto que agora a Renault recebe por isso. Esta
solução praticamente mantém o mesmo staff da fábrica de Viry-Chatillon, onde
são projetados e construídos os motores franceses, que na última temporada foi
usado pelas duas equipes bancadas pela empresa de energéticos.
E aqui o cenário ganha um outro foco: a solução deve ser
imitada pela Ferrari, que alugaria seus motores para a Toro Rosso rebatizados
de Alfa Romeo. A semelhança não se restringe a esta forma de contrato: Sergio
Marcchione, o patrão da marca italiana é o mesmo da Ferrari e está para o grupo
FCA (Fiat Chrysler Automobiles) assim como Ghosn está para a aliança
Renault-Nissan. Ambos são executivos agressivos, transitam bem entre seus pares
de outros grupos automobilísticos e jogam o mesmo jogo de Ecclestone. Ou seja,
estão com os motores e a gasolina nas mãos enquanto o inglês parece cada vez
mais na pista e sem equipes: cada vez mais as grandes corporações interferem
mais nas estruturas outrora gerenciadas por garagistas apaixonados.
Na esperança
de manter o poder é preciso criar alternativas e refazer alianças, mas. por
enquanto esta tática não tem funcionado: Ecclestone chamou o advogado e amigo
para defender a causa de um motor mais barato e que seguia regras mais
tradicionais e livres, mas a Ferrari foi contra e a manobra foi abortada. Agora
o inglês se alia ao seu alvo preferido para a prática do fogo amigo, Jean Todt,
na esperança de ganhar poderes para mudar o que quiser na F-1. Se os
presidentes e cartolas da FIA deram esse aval, nada foi combinado com as novas
forças da categoria, leia-se Carlos Ghosn, Sergio Marchionne e Toto Wolf, que
representa a Daimler AG.
Aston Martin é a nova ponte para o futuro
A Aston Martin
está próxima de anunciar que assumirá o controle da equipe Force India. Vijay
Mallya, empresário indiano que assumiu a equipe em 2008, foi levado a se
desfazer do negócio em conseqüência de fracassos financeiros em outros
empreendimentos, entre eles a empresa de aviação de baixo custo Kingfisher. A
fabricante dos luxuosos esportivos já fez sucesso nas pistas, tendo vencido
várias vezes em Le Mans, na F-1 seus carros alinharam em quatros GPs em 1959 e
um em 1960, sem maior expressão. Atualmente 5% do seu capital está nas mãos da
Daimler, cuja marca Mercedes-Benz continuará fornecendo motores, que serão
rebatizados de…Aston Martin. Repete-se aqui a receita descrita acima.
WG
WG
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