Se você pudesse fabricar uma motocicleta do zero ao seu próprio gosto,
como seria o projeto dos seus sonhos? Que tal um conjunto de rodas de 36 polegadas
totalmente vazadas e com pneus de perfis baixos fabricados exclusivamente para
o modelo? Ou então um motor aeronáutico Rolls-Royce Continental V6 da década de
1960 com 300cv de potência, junto a um design futurista e muita fibra de
carbono, cromados e ligas metálicas nobres em todo o conjunto?
Parece ficção
científica? Pois esta foi exatamente a fórmula utilizada por um brasileiro já
bem conhecido do público brasileiro por seus projetos inovadores, para dar vida
ao seu grande sonho: a motocicleta TMC Dumont, projeto 100%
brasileiro da Tarso Marques Concept, do ex-piloto de Fórmula 1 e
Indy, Tarso Marques, que venceu o maior campeonato de customização
nos Estados Unidos.
Recém-chegado
dos Estados Unidos, Tarso Marques foi, mais uma vez, o grande vencedor do mais
famoso e tradicional campeonato de customização mundial, realizado entre os
dias 9 e 18 de março, em ocasião do maior evento de motos do mundo: o Daytona
Bike Week 2018. Organizado todos os anos em Daytona Beach, na Flórida, o
local se transforma em uma verdadeira meca para os motociclistas durante essa
época do ano. Com 77 anos de tradição e reconhecimento mundial, reúne sempre os
maiores fabricantes e customizadores do mundo nas ruas da famosa praia
americana.
Para ter ideia
de sua dimensão, são mais de 500 mil pessoas que participam da festa, todos com
um mesmo gosto: a paixão pelas motos. Não por menos, por lá já saíram nomes
famosos da fabricação e customização de motocicletas, como os integrantes da
família Teutul, da Orange County Choppers; além de Dave Perewitz, Indian Larry,
Cyril Huze, entre outros.
E foi neste
palco e com este cenário que o brasileiro Tarso Marques conquistou seu 6º
título de customização em Daytona. No entanto, nesta edição de 2018, a
vitória teve um sabor especial para ele e para todos os brasileiros. Pela
primeira vez, Tarso concorreu com uma motocicleta criada e desenvolvida
totalmente no Brasil. O nome TMC Dumont, é alusivo a seu estúdio e uma
homenagem ao pai da aviação nacional, o brasileiro Alberto Santos Dumont.
Definitivamente,
é muito mais fácil olhar para a TMC Dumont do que tentar descrevê-la. Seu
visual é tão futurista e fora do convencional que parece uma escultura ou algum
projeto recém-saído de um filme de ficção científica. Gera dúvidas,
questionamentos e desafia qualquer pessoa a tentar entender como certas
soluções passam a fazer sentido para que o modelo possa rodar na rua como uma
moto convencional. E, acreditem, ela consegue fazer isso com total maestria e
elegância, de acordo com seu projetista.
“É um projeto
especial com o qual já venho sonhando há, pelo menos, 15 anos. Não o desenvolvi
antes pois era muito difícil de concretizá-lo sem auxilio tecnológico de
parceiros de fora. E eu queria que este fosse um projeto 100% brasileiro. Sem
qualquer fornecedor estrangeiro. Tudo nela foi desenvolvido e fabricado no
Brasil, da pintura repleta de areografia à usinagem das rodas e chassi.”, conta
Tarso Marques.
Para ele, a TMC
Dumont foi um dos maiores desafios de sua carreira, uma vez que o conjunto
mecânico e toda a parte ciclística tiveram início sem qualquer ponto de
referência. Tudo foi pensado e desenvolvido no Brasil dentro da Oficina da TMC,
na Vila Olímpia, em São Paulo.
O primeiro passo
para seu desenvolvimento foi capacitar a equipe e as instalações da TMC Concept
no mesmo nível das melhores oficinas do mundo. Para isso, Tarso não poupou
investimentos e buscou os maquinários mais modernos disponíveis no mercado.
Tudo com objetivo de dar vida ao seu projeto mais ousado e inovador até então.
Para esta empreitada, o empresário diz que precisou de muita mão de obra.
“Ao todo foram adquiridas máquinas centro de usinagem Romi de alta precisão com
acessórios Sandvik, máquina de Laser Mark e Router da ECNC, equipamento Eletron
para evitar corrosão nos metais, scanners a laser da Faro Technology,
impressoras 3D da Wishbox; assim como softwares de engenharia para
desenvolvimento de novas peças baseados em tecnologia de ponta, como Solidworks
/ IST sistemas. E, claro, muito treinamento da equipe também”, informa.
Com todo equipamento em mãos, Tarso Marques precisou apenas iniciar os desenhos
e projetar a motocicleta para o início da produção do modelo. Para ele, o maior
incentivo estava no desafio em construir algo único em seu próprio país. “Tirar
minha ideia da mente e passar para o computador foi a parte mais fácil. Difícil
mesmo foram os desafios provenientes deste sonho. No entanto, tínhamos este
objetivo e iriamos concretizá-lo.”, enfatiza.
A ideia de um
projeto único foi levada tão a sério que a TMC Dumont impressiona até aos mais
céticos. Seu motor, por exemplo, é de aviação e foi a única parte que precisou
de auxilio especializado. “Encontramos esse motor da década de 1960 totalmente
acabado em um aeroclube no Paraná. Como em aviação todos os sistemas são
redundantes e mais complexos, refazer todo o motor e padronizá-lo para rodar de
forma mais simples em uma motocicleta demandou mais tempo”, comenta o designer.
O projeto exigiu
abrir o motor inteiro e praticamente refazê-lo, desde refrigeração, bomba de
combustível, até usinagem de algumas peças específicas. A parte de transmissão
do tipo CVT utilizada, por exemplo, teve que ser desenvolvida pela própria TMC,
projeto e fabricação. “Na restauração do motor, tivemos total apoio da
Universidade Tuiuti (PR), com equipe formada por alunos e professores do curso
de engenharia. Para se ter ideia, até mesmo o conjunto de freios, formado pelas
pinças e discos, foram totalmente fabricados por nós, no corte a laser e
usinagem na TMC”, explica.
Um dos pontos de
maior destaque da TMC Dumont são seus conjuntos de rodas. É praticamente
impossível ficar indiferente ou não se impactar frente ao seu design e forma.
Seu conjunto também foi totalmente desenhado em Solidworks e usinado no Brasil
pela própria TMC.
Segundo Tarso, estas são as maiores rodas do mundo já
fabricadas para uma motocicleta, com 36 polegadas de diâmetro, praticamente 1,5
metros de altura. Outro detalhe importante está no fato de elas serem
totalmente vazadas, sem aros ou cubo central. Ficam fixadas em uma seção
inferior das rodas de forma sutil, para que a ideia de que o modelo rode
“flutuando” fique evidenciada. Os pneus também tiveram de ser totalmente
fabricados pela TMC e são exclusivos para uso da Dumont.
Mas não é só no
design que ela é impactante. Muito do que seu conjunto apresenta no que se
refere às soluções de engenharia, deixariam qualquer expert no assunto muito
surpreso. Segundo Tarso Marques, algo que impressionou muito até mesmo os
americanos, acostumados com projetos conceituais pouco usuais, foi a ausência
de bengala para fixação da suspensão e roda traseira, assim como do garfo
dianteiro, também para fixação da suspensão, guidão e roda dianteira.
Outro destaque é o chassi. confeccionados pela própria TMC, é eficiente e
projetado em alumínio com cromo-molibdênio, de forma a oferecer maior
resistência.
Aliás, vale
dizer que praticamente todos os detalhes na TMC Dumont ficam “escondidos” e
longe dos olhos mais curiosos e detalhistas. Do cabeamento do guidão,
velocímetro, iluminação retrátil, até tanque de combustível em alumínio (16
litros), reservatório de óleo (8 litros) e conjunto de suspensões - reguladas
eletronicamente por um botão ou controle remoto - é praticamente impossível
dizer qual componente é o que. De ponta a ponta, a fluidez e beleza de
suas formas fazem com que seja praticamente impossível desvendar o mistério que
faz tudo funcionar com harmonia e eficiência na TMC Dumont.
Como o modelo
era um projeto totalmente além do que se conhece hoje sobre customização de
motos, Tarso Marques procurou manter segredo sobre sua fabricação durantes os 3
meses de montagem da motocicleta. “Gravamos toda a construção, mas procuramos
manter segredo até o último momento para evitar comentários. O primeiro teste
dinâmico, por exemplo, fizemos durante uma madrugada em São Paulo, sem ninguém
notar”, diz.
O primeiro
teaser em vídeo foi divulgado apenas poucas semanas antes do evento principal,
nos Estados Unidos. O vídeo produzido por Tarso não apenas viralizou entre os
fãs de customização e participantes do evento, como gerou muitos comentários e
compartilhamentos sobre o projeto. “Na verdade, foi até divertido. Poucas
semanas antes de viajar para Daytona e já com a moto finalizada, pedi que fosse
produzido um vídeo para divulgarmos na internet, um pequeno teaser anunciando
nossa participação na competição”, diz Tarso.
E complementa:
“Neste vídeo solicitei uma edição em que a moto parecesse estar parada e o
asfalto se movendo, em um cenário bem lúdico e surreal. A ideia era fazer com
que todos duvidassem tratar-se de uma moto de série, mas sim, de um protótipo.
E realmente conseguimos tal feito. Porém, uma das regras para participar do evento de customização é que a moto deve realmente funcionar
e rodar normalmente. Para surpresa de todos, fiz questão de chegar ao evento
pilotando a TMC Dumont. E foi algo bastante gratificante e divertido ver a
reação das pessoas”, conta tarso.
Para ele, já
bastante acostumado com projetos totalmente exclusivos, a TMC Dumont
representou não apenas a concretização de um sonho. Mais do que isso, o
objetivo foi levar o nome do Brasil à frente.
“O modelo é
inovador e representa fielmente agora a capacidade que nosso país tem em
concretizar projetos únicos. O motor de avião, o visual futurista e até o
guidão e painel inspirados na aerodinâmica dos aviões, fizeram com que este
projeto da TMC Dumont homenageasse um brasileiro visionário: Alberto
Santos Dumont. Minha maior motivação foi mostrar para os americanos a nossa
capacidade de criação e inovação com um projeto 100% nacional. E acho que esses
troféus das fotos respondem bem essa dúvida e comprovam que, não apenas tivemos
sucesso, mas que o sonho valeu a pena”, finaliza.
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