Fernando Calmon |
QUANDO RECALL FICA AINDA
MAIS CARO
O histórico de recalls no Brasil é longo. O primeiro
aconteceu em 1970, envolvendo 50.000 unidades do Ford Corcel. Havia sido
lançado no final de 1968 e se corrigiu um defeito que causava instabilidade
direcional e consumia pneus dianteiros em demasia. Naquela época não existia um controle rígido
sobre segurança. Tanto que a primeira convocação registrada pelo Departamento
de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC) só ocorreu em 1998 e atingiu 23.800
ônibus OF 620 da Mercedes-Benz com problema no suporte da coluna de direção.
Recall é uma palavra da língua inglesa que tem vários
significados, entre eles revocar (chamar de volta) também existente em
português. Então revocação seria o termo exato, embora de pouco uso. O conceito,
às vezes, costuma ser confundido. Essa ação corretiva se refere apenas a itens que
impactam na segurança do carro e de terceiros. Defeitos técnicos gerais ou de controle
de qualidade estão fora do contexto, desde que sem potencial de causar acidentes.
Um caso recente levantou discussões. A Volkswagen resolveu,
em 2017, revocar a picape Amarok para retirar o dispositivo condenado em outros
países por fraudar testes de emissões. O tal dispositivo estava, segundo a VW,
desabilitado no Brasil e aquele motor diesel atendia as normas do país. Estas
são frouxas (por enquanto) em relação à Europa e aos EUA. A empresa recebeu
multas do Ibama, da Secretaria Nacional do Consumidor e do Procon de São Paulo.
A discussão continua na Justiça e até hoje não se resolveu.
Recalls acontecem às centenas no mundo e atingem todas as
marcas, de generalistas às premiums. Airbags defeituosos da Takata levaram à
falência a fornecedora japonesa depois de atingir mais de 100 milhões de automóveis
em vários países desde 2014. Foi o pior evento desse tipo na história. No Brasil,
a maior operação incluiu mais de um milhão de modelos Chevrolet, Corsa e Tigra,
em 2000, para corrigir a fixação do fecho dos cintos de segurança dianteiros.
Há um mês o novo Chevrolet Onix Plus passou por revocação
depois de uma unidade no Maranhão pegar fogo. Por erro de calibração da central
eletrônica, um processo severo de pré-ignição destruiu pistões, bielas, bloco
do motor e provocou incêndio que consumiu o carro de ponta a ponta. Antes houve
outro incêndio no pátio da fábrica, em Gravataí (RS). Mas o fogo começou no
interior do sedã, em unidade estacionada, por outra causa que a GM não informou.
No total, 19.050 veículos receberam a mudança.
Recentemente o mesmo modelo apresentou vazamento de
combustível. A empresa, até o momento, não decidiu ir além de uma campanha de
serviço. Trata-se de um estágio intermediário, sem ligação a um recall, quando
o fabricante julga que os riscos são muito baixos. Existe ainda uma etapa
básica para corrigir falhas de acabamento em cortesia.
Informações não oficiais relatam que a substituição do
conector na saída do tanque de combustível resolve o problema, durante passagem
dos carros pelas oficinas das concessionárias nas revisões em garantia ou
outros motivos. Mas a GM terá de convencer o Procon de que este não é caso de
revocação. Há ameaça de aplicação de uma multa de R$ 10 milhões. O processo de
análise de riscos inclui encontrar a solução, encomendar novas peças (como
neste caso), passar pelo crivo jurídico interno, preparar a rede de
concessionárias e aprovar tudo junto ao DPDC. A providência final é o anúncio
nos meios de comunicação.
A matriz das fabricantes faz parte do arcabouço de detecção
e resolução destes casos. No caso do Onix, projeto global, isso se torna ainda
mais sensível por envolver outros países. Para complicar, os fornecedores podem
ser diferentes.
Recalls, em geral, não abalam um fabricante por ser inerente
ao processo industrial. Ser forçado por autoridades regulatórias, em vez de
tomar a iniciativa, é uma situação que já aconteceu até no exterior. E aí um
arranhão na imagem pode se tornar ainda mais caro.
PERFIL
Fernando Calmon (fernando@calmon.jor.br),
jornalista especializado desde 1967, engenheiro, palestrante e consultor em
assuntos técnicos e de mercado nas áreas automobilística e de comunicação. Sua
coluna automobilística semanal Alta Roda começou em 1999. É publicada em uma
rede nacional de 85 jornais, sites e revistas. É, ainda, correspondente no
Brasil do site just-auto (Inglaterra).
Siga também através do twitter:
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