terça-feira, 26 de novembro de 2013

Wagner Gonzalez em Conversa de pista

Wagner Gonzalez


Final da temporada provoca reflexão sobre o atual estado do automobilismo nacional. Enquanto a categoria máxima do esporte não dorme nos louros, vivemos entre sonhos e pesadelos




A principal categoria do mundo se reinventa e se adapta para manter a posição de principal polo de investimentos tecnológicos e promocionais do esporte a motor mundial, o automobilismo brasileiro tropeça em egos e na ineficiência da Confederação Brasileira de Automobilismo que, por seu próprio estatuto, deveria zelar por sua saúde, vitalidade e eficiência. Não é o caso de comparar os ambientes de negócios entre os dois cenários mas, isto sim, alterar o status atual que permite ao conceito monomarca ocupar cada vez mais espaços e aniquilar a verdadeira base do esporte em terras tupiniquins. Quando as vendas de automóveis no mercado nacional batem sucessivos recordes fica difícil entender porque não se consegue trazer para as pistas 1% dos 3 milhões de carros vendidos a cada ano até os nossos autódromos.

Há tempos o automobilismo brasileiro navega com mais intensidade nas águas plácidas das categorias monomarca, realidade onde a F Truck é a única exceção a essa verdadeira epidemia. Este território dos brutos é, na prática, um feudo controlado com mãos de ferro pela família Félix; ciente do trabalho que teve para criar o circo, Dona Neusa e seus rebentos toma as devidas precauções para manter sadio o único evento verdadeiramente multimarcas do País e no qual as fábricas investem em técnica e marketing. No quintal da Vicar, outra promotora de provas de pista que atua no âmbito nacional e hoje incorporada pela empresa Time 4 Fun, pratica-se o conceito do pacote fechado, mas em outros termos: os chassis, motores e suspensões são iguais para os participantes dos Campeonatos Brasileiros de Stock Car e de Turismo. Neles a construção dos chassis e a manutenção dos motores e caixas de câmbio são feitos exclusivamente pela empresa JL. Outro produto da Vicar – o Campeonato Brasileiro de Marcas - promove a rivalidade entre Chevrolet, Ford, Honda, Mitsubishi e Toyota onde, pasme-se, a única diferença entre os veículos é a carroceria.

O que se consegue com este modelo também praticado cada vez mais no kartismo é a concentração de poder e o fim de uma espécie cada vez mais rara: a dos preparadores, em especial os de motores. Nas categorias que ainda poderiam fazer a diferença nota-se, mais uma vez, a inoperância dos dirigentes, que não conseguiram evitar o nascimento de campeonatos que não superaram duas temporadas, alguns ate sequer ultrapassando o estágio de apresentação pomposa. Já os campeonatos regionais de turismo correm com regulamentos diferentes, o que acaba impedindo que exista um campeonato nacional representativo e, pior, afastando ainda mais as fábricas. Embora tenhamos um parque dos mais representativos no que diz respeito ao número de fábricas de automóveis instaladas no País, conta-se nos dedos da mão esquerda e com unha encravada  aquelas que participam de alguma maneira das corridas nacionais.

Vale lembrar que os oito títulos que os pilotos brasileiros conquistaram na F1 foram consequência de um processo onde tínhamos vários promotores, um automobilismo que abria espaço para fábricas e, principalmente, uma categoria tão boa e barata quanto à Fórmula Vê implantada pelo saudoso Mauro Forjaz, então editor da Autoesporte dos tempos em que esta revista publicava mais esporte do que autos. Graças a visionários da estirpe de Antonio Carlos Scavone, Eloy Gogliano, Mário Pati e Wilson Fittipaldi nutria-se um ambiente que gerou de projetistas de F1 a preparadores de bairro e arquibancadas cheias em autódromos e kartódromos.

Alguns argumentarão que categorias que fizeram sucesso no passado tinham algo de monomarca: a época de ouro da Divisão 3 na classe A teve domínio dos Fuscas e havia também os Festivais… de Marcas, onde cada marca ou modelo disputava sua própria bateria. Mas se a marca era mono, os preparadores eram poli e encontrar duas carrocerias idênticas naqueles grids de Divisão 3 era digno de ganhar na mega sena.  

É possível reeditar esses tempos e recolocar o automobilismo como um esporte popular e mais abrangente. Estruturar o esporte de forma a criar um sistema onde carros de ponta possam alimentar categorias inferiores após duas temporadas de uso, consolidando um mercado autossustentável, é uma possibilidade factível diante de uma queixa de alunos saídos das escolas de pilotagem: a falta de opções para praticar o automobilismo. O Campeonato Paulista de Força Livre é um exemplo disso e a categoria Marcas e Pilotos poderia incentivar a renovação de seu grid com a utilização de carros mais antigos – e portanto mais baratos -, para estreantes e novatos. Com o planejamento adequado pode-se programar uma categoria com modelos de maior cilindrada que os atuais 1,6 e com preparação mais sofisticada para atender ao progresso dos pilotos e o crescimento do evento.

Tão importante quanto isso é criar novos canais de interação com o público que pode vir novamente tornar-se entusiasta do esporte. Se a grande mídia ignora o automobilismo tanto quanto outras práticas e especialidades, que se encontre alternativas tanto na comunicação quanto no formato do espetáculo, que deve ser atraente dentro e fora das pistas. Afinal, quem se sujeita a passar o dia – ou parte dele -, em um autódromo onde o acesso é cada vez mais difícil e inexiste uma estrutura que ofereça itens tão básicos como praça de alimentação e banheiros? Estratégia, marketing e planejamento são ferramentas que podem e devem ser exploradas neste contexto e há profissionais competentes no mercado com capacidade para desenvolver um trabalho consequente.


F1 dá adeus aspirado e volta em 2014 com motor turbo

A nona vitória consecutiva do alemão Sebastian Vettel e o adeus do australiano Mark Webber dividiram as atenções do GP do Brasil disputado domingo (23) em Interlagos, prova que marcou a despedida de Felipe Massa da Ferrari. Desde 2006 usando motores V8 e 2,6 litros, a F1 usará a partir de 2014 motores turboalimentados e de configuração V6 construídos para obter o melhor rendimento energético para 100 kg de combustível na distância de aproximadamente 320 km, percurso que os pilotos percorrem a cada GP considerando-se as voltas de alinhamento, apresentação e distância da prova. Além disso serão usados recuperadores de energia mais sofisticados

O retorno à esta fórmula empregada mais recentemente entre 1977 e 1988 e a adoção de regras que proporcionem melhor aproveitamento energético atende às demandas de grandes fábricas, à necessidade de dar um apelo politicamente correto ao esporte e à perene cobrança da própria F1 em se manter como ápice da tecnologia aplicada ao automobilismo. Certamente as provas de Endurance também proporcionam o desenvolvimento de novas soluções mas é no mundo dos Grandes Prêmios que este exercício tem maior difusão. Mais detalhes sobre o regulamento do ano que vem e o motor que a Renault prepara para a próxima temporada você ler neste post de Bob Sharp.

Se o Cirquinho do Tio Bernie deu adeus ao regulamento que foi atual até anteontem, o mesmo gesto não está garantido com relação às instalações do box e paddock de Interlagos. A prometida e propalada reforma destas áreas, condição apontada como vital para manter o GP brasileiro no calendário de 2014, parece ter emperrado na burocracia que caracteriza o Estado brasileiro. Além da confusão e do desgaste que a indecisão cria no cenário internacional a ausência de um plano confiável traz consequências ao automobilismo nacional já que torna-se inviável garantir que os eventos programados para o autódromo paulistano possam ser anunciados e confirmados.


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