Júlio faleceu no último
dia 15 de fevereiro, em São Paulo, depois de ter trabalhado 37 anos na área de
Serviço da Ford e de ter como importante legado a fundação, juntamente com seu
filho Nelson, do Clube do Ford V8.Imaginar o cenário de 1919, quando a Ford se
instalou no Brasil e começou a montar e vender o Ford T é uma viagem no tempo,
para uma época em que, praticamente, não havia estradas no país.
Com o desenvolvimento da produção em massa, os
automóveis ganharam o mundo e também o Brasil. Foi uma época de prosperidade,
logo após o fim da primeira guerra mundial, na Europa.
Consciente da importância da formação e
treinamento de mecânicos para o trabalho de pós venda e assistência técnica aos
clientes da marca, a Ford criou a Escola de Mecânica. Em 1920, a Ford Brasil já
conseguia vender cerca de 4.000 unidades/ano do modelo T e o mercado não
dispunha de mecânicos de automóveis e nem de oficinas, principalmente no
interior do país.
O próprio Henry Ford sempre anunciou sua crença de
que “o simples ato da venda de um veículo não completa a transação com o
cliente. Pelo contrário, aí é que começam nossas obrigações”. Foi nesse momento
histórico que começou a carreira de Júlio Ott na Ford como Inspetor de
Serviço, profissional devidamente treinado na fábrica. Ele e outros
companheiros faziam contínuas viagens pelo interior visitando as “Agências
Ford”, como eram conhecidos os concessionários Ford.
Nesses deslocamentos Júlio e seus companheiros
ministravam aulas aos futuros mecânicos, organizavam as oficinas e seções de
peças e ainda visitavam os clientes para inspecionar as unidades vendidas.
Mais tarde, à medida que as estradas melhoravam,
passaram a usar Escolas de Serviço Volantes, viajando por todo país.
Por volta de 1926, grande parte dos Agentes Ford
já dispunha de oficinas bem equipadas. As revendas importaram dos Estados
Unidos um kit da Oficina-Modelo (Model Service Shop Kit), que incluía todo
ferramental especial, ferramentas comuns e equipamentos em geral, inclusive
para pintura.
Os carros escola eram sediados em São Paulo, Porto
Alegre e Recife e construídos localmente sobre chassi Ford comercial (furgão),
especialmente para acomodar todo o material necessário aos cursos, aparelhos de
testes e de projeção e material didático. Além do equipamento normal para
instrução, ainda transportavam material extra para enfrentar as dificuldades
das estradas: macaco de manivela (realejo), cabo de aço para reboque, guincho
manual, enxadão, machado, pá, correntes para as rodas e um par de pneus
lameiros.
Antes do lançamento de novos produtos, era
providenciada a instrução dos mecânicos para que entendessem componentes
desconhecidos como, por exemplo, o novo motor V8, em 1932 e, mais tarde,
em 1939, a introdução do sistema de freio hidráulico.
Nesse cenário, Júlio Ott se consagrou como mais um
“fordista” apaixonado tornando-se um exemplo de carreira, um pioneiro que muito
colaborou nos bastidores do desenvolvimento da indústria automobilística
nacional. Ele foi o Inspetor da Ford no Rio Grande do Sul e, em 1966, mudou-se
para São Paulo para acompanhar o treinamento das equipes para a produção do
Galaxie no Brasil.
Aposentado, Júlio se tornou um apaixonado por
antigomobilismo que era seu principal hobby. Nascido em Jaguariaiva, no Paraná,
dedicou-se, por muitos anos, à restauração de carros antigos e ao Clube do Ford
V8. Faleceu na capital paulista aos 92 anos deixando dois filhos, Nelson e
Paulo.
Difícil retratar a época de heroísmo em que viveu.
Foi uma vida inteira dedicada à Ford e ao Clube do V8 e que encerra mais um
capítulo da memória da companhia e dos homens que permitiram o crescimento da
imagem da marca entre os brasileiros.
A dedicação desses “mecânicos”, que viveram fora
dos holofotes e das páginas de jornais e revistas, foi fundamental o avanço da
indústria automobilística no Brasil. Eles enfrentaram episódios inesquecíveis
na luta para bem servir o crescente mercado da assistência técnica e serviços.
Um deles, Júlio Ott, em especial, merece o tributo e o reconhecimento pela sua
dedicação histórica.
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